Sobre nossos filhos nos lembrarem do que importa

Sobre nossos filhos nos  lembrarem do que importa


“Meu nome é Antonella Corradi. Mas pode me chamar de Tontom”. É desse jeitinho. Aos cinco anos de idade. Proativamente. Sem ninguém mandar. Espontaneamente. Mas sobretudo, como lhe é afeito; de maneira extremamente amorosa.

Sem a prática, qualquer ensinamento se esvai gradualmente. Um filho nos ensina no ato do nascimento sobre a prioridade de que apenas escutávamos até aquele momento. A prioridade das coisas que realmente são importantes, nesta dádiva de Deus, a que chamamos vida terrena. Mas é sem dúvida nas tardes mais comuns, quando o peso de todos os problemas me parece fazer se esquecer disso, que meu tiquinho de gente, caçula, ancora minha percepção no lugar correto. Uma aproximação despretensiosa. Uma encostadinha de lado, como que testando se vai conseguir a atenção do pai. E minha Antonella, que completou 5 anos neste dia seis de março, solta um sorriso embalado: “Papai, você é tão quentinho...”. Segue-se um beijinho dentro do abraço mais seguro do planeta Terra. E o retorno à brincadeira de bonecas, na mesma naturalidade com que ela foi interrompida. Meu Senhor presenteia-me com a oportunidade de viver isso numa frequência de felicidade verdadeira muito maior do que eu jamais imaginei. Afinal, sempre acreditei que os tesouros maiores eram longínquos. Até perceber, na doçura da Tontom, que é minha incompetência em cultivar ensinamento tão óbvio que desvia meu olhar do lugar correto.

Quando os filhos são novinhos, é comum acharmos que nós deitamos em seus travesseiros para provar que o monstro debaixo da cama é pequeno perante suas coragens. Na verdade, o que deixamos escapar é o fato de que nestes mesmos instantes eles é que estão nos provando que os monstros revestidos de problemas da vida adulta são minúsculos. Perante a importância do amor que eles nos ensinam.

Algumas pessoas costumam se perguntar como era possível um mundo sem celular. Algo inimaginável até para quem viveu a época do orelhão. Eu me pergunto com franqueza como seria possível simplesmente ser, sem o barulho da Tontom pela casa. Cinco anos de uma filhinha são a verdadeira reforma filosófica em qualquer cosmovisão masculina que se achava sabedor dos próprios desígnios. Deus é bom demais para me permitir flertar com a Face Beatífica, em cada olhar da minha pequena. É aquela história: aprendi recente por que Deus Pai nunca revelou Sua Face para nós viventes humanos. Achei a explicação boa demais. Afinal, o conceito de Amor pressupõe uma escolha. Uma obrigatoriedade confronta a liberdade, que é raiz do conceito de Amor. A Visão Beatífica da Face de Deus Pai seria tão perfeita que a nós não caberia outra opção, senão amá-lo. Assim, passamos nossa existência terrena com a principal missão de aprender a amar Nosso Criador – a fim de sermos brindados com isso na eternidade do Céu. Linda explicação. Mas sucumbo no meu pensar: qual outra opção a paternidade me oferece quando minha Tontom derrama uma mistura de confiança e espontaneidade no meu colo de pai? Impossível não pensar na inescapabilidade da Visão Beatífica.

A vida no seu formato mais genuíno. As prioridades deste mundo confuso explicadas sem uma única palavra. Todos os livros jamais escritos sobre felicidade resumidos na mera presença de alguém, cujo único propósito é nos lembrar, sem querer, como a Vida (com maiúscula neste caso) é sobre um sorriso. E tudo que ele nos mostrar ser pequeno.

Obrigado por ser minha filha, Antonella. Papai é que comemora cinco anos como seu aprendiz.