Sob os ventos da redemocratização, de novo

Sob os ventos da  redemocratização, de novo


Na última edição de 2022, na data de 31 de dezembro, a FOLHA trouxe na página 12 a matéria “Chega 2023 com a cidade tomada por andarilhos e muito lixo “, que mostrou a crescente quantidade de pessoas vivendo nas ruas de Itaúna sem o devido amparo do poder público municipal, em um contraponto com o aumento do lixo nas vias públicas, o que faz um paralelo triste, mas que retrata como o Município vê essas pessoas à margem da sociedade e seu descuido com os dois tópicos. 

E, em minha opinião, além dos reflexos nacionais na área de direitos humanos ocasionados pelo tenebroso governo federal que deixou o poder no ano passado, a situação da cidade é um retrato da política praticada pelo governo do atual prefeito, que demonstra pouco se importar com as pautas de direitos humanos, desenvolvimento e assistência social, e não apresentou nenhum projeto concreto nesses assuntos desde o início do primeiro mandato, em 2017.

O assunto é urgente em nossa cidade e é gritante também em todo o Brasil. Porém, em nível nacional, com a posse do novo governo federal, o ano começou com esperanças e fortes afirmações dos dirigentes do País de que essas pautas serão novamente levadas em consideração e ação. Exemplo que pode ser seguido por Itaúna e seus governantes, a maioria focada apenas no assistencialismo barato e que dá votos. Atualmente, em minha visão, há apenas uma representante do povo na Câmara que realmente cria projetos e desenvolve ações que vão além do socorro imediato (apesar de também fazê-lo, de fato, com garra e disposição, quando é preciso), pensando em mudanças sociais e em representatividade real, a novata Edenia Alcântara, que tem pouco tempo de Legislativo, mas a vida toda de experiência em saber o que é ser invisibilizada. 

São pessoas como ela que devem estar à frente do poder, são para pessoas com experiências como as dela (ou para quem luta pelos que têm menos chances) que entrego os meus votos. Não dá para ter representantes que não têm empatia pela dor do outro, que administram do alto de seus privilégios desde o berço. Na terça-feira, 3, tivemos um retrato da importância disso, quando Sílvio Almeida (autor do livro Racismo Estrutural) assumiu o Ministério dos Direitos Humanos e em seu discurso, com a frase “Vocês existem e são valiosos para nós”, disse que iria lembrar o óbvio até então negligenciado, destacando cada um que faz parte da diversidade brasileira e que será considerado de agora em diante, pois nunca deveriam ter sido abandonados como foram: trabalhadores, mulheres, pretos, povos indígenas, LGBTQIA+, pessoas em situação de rua, pessoas com deficiência, anistiados, vítimas de violência, da fome e da falta de moradia, que sofrem com a falta de acesso à saúde, empregadas domésticas, que sofrem com a falta de transporte, todos que têm os direitos violados. Que grande vitória, que enorme satisfação e alívio nacional! – da figura do retrocesso Damares para o professor e filósofo, que resgate!

A escritora Carolina Maria de Jesus, no livro Quarto de despejo: diário de uma favelada, cravou a célebre verdade: “O Brasil precisa ser dirigido por uma pessoa que já passou fome. A fome também é professora. Quem passa fome aprende a pensar no próximo, e nas crianças”. E eu ouso completar que à frente do Ministério dos Direitos Humanos, como temos agora, também deve estar alguém que conhece muito bem o sentimento de ser invisibilizado – lembro aqui de parte da entrevista de Sílvio para o Mano Brown, no podcast Mano a Mano, em que narra o dia em que se descobriu negro, quando uma professora o repreendeu por usar um gorro num dia frio, porque o “fazia parecer um bandido”, vale a escuta. 

E, confiando nas ações de seu ministro, o presidente que já passou fome está de volta, subiu a rampa do Planalto pela terceira vez no dia 1º de janeiro ao lado do povo brasileiro, recebeu a faixa presidencial das mãos desse mesmo povo citado pelo ministro e foi uma mulher catadora que a colocou em seu peito, recolocando também o Brasil nas mãos de seus moradores, criando a bela e reconfortante imagem de como será a política federal de agora em diante. 

Mesmo com a problemática realidade de Itaúna, encerro com otimismo. Como tenho o costume, o título deste artigo novamente não é meu, mas inspirado e copiado de um trecho do emocionado e emocionante discurso de posse de Lula, cujas palavras uso para nos dar ânimo e a certeza de que valeu acreditar: “Sob os ventos da redemocratização, dizíamos: ditadura nunca mais! Hoje, depois do terrível desafio que superamos, devemos dizer: democracia para sempre!”. É hora da “reredemocratização”, de novamente garantir direitos básicos, humanos.

Ainda teremos mais dois anos de governo municipal e espero que o prefeito, que apoiou a candidatura de Lula, siga o seu exemplo, corra atrás dos recursos para além de asfalto, foque em seu povo! Pare de dar cargos para cumprir acordos e busque alguém que tenha capacidade de fazer pela sua gente que sofre. Procure alguém que já passou fome para lhe aconselhar e direcionar, ouça a periferia, quem usa o transporte público. Como mostra o seu currículo no site da prefeitura, a secretária de Desenvolvimento Social não tem formação alguma em assistência social e, que eu saiba, por ironia, vive em um prédio no Centro, de onde, provavelmente, pode assistir todas as noites o sono dos que dormem amontoados sob as marquises e o coreto na Praça da Matriz.

Patrícia Campos