Ao Drag Queen que se vestiu de Nossa Senhora
A apresentação do Drag Queen Glayan Vogan que se vestiu de Nossa Senhora, ao som da música Hallelujah, num evento LGBT de Itaúna, na última semana, é assunto sério e precisa ser endereçado publicamente. Mas por motivos que não vi nos discursos contundentes contra ou a favor.
Assisti ao vídeo de um pré-candidato político protestante de direita Vítor Teles, que se posicionou contra. Mas por motivos que misturaram “lixo no chão do evento” e “intimação para que suas opositoras políticas se posicionassem”. E li o artigo da jornalista militante de esquerda Patrícia Campos Guimarães, que se posiciona a favor. Mas por motivos que misturam direitos civis, protesto contra a hegemonia conservadora e ataque generalizado a quem pensa diferente dela: “tudo farinha do mesmo saco”. Em ambos os casos, nem o candidato político conservador Vitor Teles, nem a jornalista assessora política progressista Patrícia Guimarães, separam a triste confusão teológica cometida na apresentação dos conceitos de militância política, imaginário cultural e direitos civis. Mais do que isso; a posição dos dois interlocutores ideológicos trata o assunto atacando o outro lado, como se o Drag Queen que subiu ao palco tivesse necessariamente cometido uma de duas ações: teria ele agido por pura má fé - com a intenção de agredir quem tem ideologia diferente. Ou teria ele agido inocentemente - sem imaginar que católicos ficariam escandalizados.
Falta uma terceira hipótese.
Há sim algo terrivelmente errado e extremamente ofensivo na apresentação. Mas o motivo disso parece ter fugido à prezada jornalista Patrícia e ao prezado político Vítor. Faltou uma enorme quantidade de entendimento teológico verdadeiro por parte do Drag Queen e de quem o assessorou em sua produção. Seria apenas divagação eu tentar adivinhar o que se passou no coração e na cabeça do artista. E por isso, não o farei. Não o julgarei por suas escolhas ideológicas e pessoais, tampouco me enxergo em posição de misturar suas preferências políticas com o alvo de minha crítica. Espero que este texto transmita o trato digno que o ser humano Glayan Vogan merece, ainda que eu discorde profunda e tristemente da atitude dele neste dia.
O alvo deste artigo é esta apresentação encenada pelo Drag Queen. Não me dirijo à pessoa (ao pecador), mas à atitude (ao pecado). O objeto deste artigo não deve ser confundido com uma crítica à comunidade LGBT, tampouco deve ser confundido com uma crítica ao direito de as pessoas exercerem seu livre direito de fé e liberdade civil. Muito pelo contrário: hoje venho escrever em defesa da minha fé e da fé de bilhões de católicos. É sobre nosso direito em não sermos agredidos, com a mesma dignidade que é oferecida ferozmente às minorias, a exemplo do próprio movimento LGBT.
Em 2016, Sua Santidade o Papa Francisco refletiu belamente: “Quantas vezes dizemos: ‘este é um pecador, fez isso e aquilo’, julgamos os outros. Mas, e tu? Cada um de nós deveria se perguntar: sim, aquele é um pecador, mas e eu? Todos somos pecadores, mas todos somos perdoados, todos temos a possibilidade de receber este perdão que é a misericórdia de Deus”. Este mesmo Santo Papa ocupa a cadeira que pertenceu a São Pedro, apóstolo primeiro do Deus Todo Poderoso que Se fez encarnado em Jesus Cristo.
A fé católica nos ensina que em assuntos passíveis de linchamento moral generalizado, devemos antes de apontar o dedo, diferenciar o pecador do ato de pecado que está sendo analisado. E que esta análise do pecado (e não do pecador) tenha como objetivo a salvação de almas, por meio do acolhimento que a eterna misericórdia divina oferece irrestritamente a absolutamente qualquer ser humano que com ela possa se arrepender e aprender. Sem diferenciar qual foi sua história até o momento em que esta pessoa resolveu buscar a Verdade e, por meio da franqueza, da humildade e da inteligência se abriu ao dom da fé que Nosso Senhor oferece desde seu sacrifício na Cruz.
Percebem, caros Patrícia, Vítor e demais torcidas apaixonadas por política? Percebem que para nós católicos o que ocorreu na apresentação do DragQueen tem menos que ver com militância, autoafirmação civil e política e mais a ver com o sobrenatural? Permitam-me explicar em detalhes.
Em primeiro lugar, nossa religião católica não é a religião de um livro. Mas sim a fé da Carne. Do santíssimo e imensurável Sacrífico que Nosso Senhor fez por nós ao se entregar para este mundo natural como Deus Encarnado, por meio do VENTRE de Maria, a fim de vencer o pecado e permitir que nossas almas arruinadas e decaídas tenham chance de viver a vida eterna ao lado do Pai. Nós acreditamos SIM que a bíblia seja escrita por meio de inspiração divina. Aliás, não apenas acreditamos, mas sabemos que foi a Santa Igreja Católica – fundada por Jesus Cristo sobre Pedro – que disse à humanidade em quais livros poderia acreditar que estava o sopro divino, quando consolidou os 46 livros do Antigo Testamento junto aos 27 do Novo Testamento, nos Concílios de Hipona (393), de Cartago (397 e 419) e de Trento (1545). Depois disso, lamentavelmente, vieram muitas pessoas – começando por Lutero – que resolveram interpretar as Sagradas Escrituras do seu próprio jeito e criaram mais de 40 mil denominações protestantes e, portanto, mais de 40 mil jeitos diferentes de desenhar os desígnios de Jesus Cristo e, portanto, mais de 40 mil jeitos diferentes de afirmar o que Deus Encarnado prega. Lá atrás, quando Cristo fundou Sua Igreja católica sobre seus apóstolos, Ele também entregou outros dois pilares da Fé que possuem o mesmo peso da Bíblia: a Sagrada Tradição e o Santo Magistério – que em suma impedem que a interpretação da bíblia seja mais de uma, porque a Santa Igreja a resguarda.
Nesse contexto, nossa fé católica apostólica romana enxerga que Maria, mulher imaculada a quem veneramos, digníssima sobretudo por meio da graça abundantíssima que seu VENTRE SAGRADO carregou, pode e deve ser sempre relembrada por meio das mais diversas denominações que seus devotos a direcionam – neste caso sobre o qual conversamos: sob o carinhoso nome de Nossa Senhora Aparecida. Neste ponto, acredito ser válido relembrar que quase todas denominações protestantes não entregam nem de perto o valor e a veneração que a fé católica dá a Nossa Senhora. Nossa Senhora Aparecida, portanto, não é uma mera figura de “imaginário popular” para nós católicos. E me parece ser apenas dentro do catolicismo que ela é venerada com esta deferência sobrenatural (algo que não é deste nosso mundo!). Portanto, quando o Drag Queen leva a figura de Maria Santíssima para seu palco é com o catolicismo que ele está dialogando.
Esclarecido isso, basta então entendermos por que é agressivo, desrespeitoso e uma afronta inominável à fé católica o que o prezado Drag Queen fez. Nossa Senhora É (pois ainda está viva em carne e osso nos Céus) uma mulher de ventre sagrado, cuja mera memória é o suficiente para nos proteger com seu manto de amor e intercessão junto a Seu Filho – assim como fez nas bodas de Canãa. Nossa fé católica enxerga que o ser humano ou nasce homem ou nasce mulher – condições imutáveis. É indignante para nós que qualquer pessoa que não seja uma mulher (e devidamente imbuída da contrição de seus pecados perante um confessionário prévio) possa se transvestir de Nossa Senhora e pretender ilustrar uma veneração pública. Para nós, prezado Glayan Vogan – a quem me dirijo com o respeito que eu gostaria de receber – isso machuca mais do que você possa imaginar. E se algum dia você quiser entender ainda mais profundamente sobre o entendimento católico de pecados e misericórdia divina infinita, pode contar com minha ajuda.
Que Nossa Senhora nos proteja a todos com seu manto de amor, em especial nestes tempos tão tristes de agressividade gratuita.