Tomás Teixeira, cofundador de Itaúna

A memória de Itaúna guarda em seu alicerce o nome de Tomás Teixeira, companheiro inseparável do sargento-mor Gabriel da Silva Pereira nas primeiras jornadas que abriram picada entre o mato cerrado e o sonho de fundar um povoado. A história o coloca como cofundador da cidade, presença constante nas diligências de exploração e na luta pelo estabelecimento das primeiras posses. O testemunho dos documentos cuidadosamente garimpados pelo historiador Guaracy de Castro Nogueira registra Tomás ao lado de Gabriel em negociações de terras, compra de fazendas e mesmo em doações que se destinavam à construção da capela de São Sebastião, marco espiritual que acompanhou a fixação das famílias pioneiras.
As fontes arquivadas e pesquisadas pelo Dr. Guaracy de Castro Nogueira relatam que Tomás Teixeira, homem de origem portuguesa, natural da freguesia de Nossa Senhora do Mártires, em Lisboa, chegou ao Brasil no início do século XVIII e logo se estabeleceu em Minas, envolvido nas atividades mineradoras e no comércio. Sua trajetória se entrelaça com a de Francisco de Araújo e Sá, doador de terras que se converteriam em patrimônio destinado à Igreja. Nessas transações Tomás aparece como testemunha confiável, reconhecido por pares como figura de autoridade e de confiança.
A presença de Tomás não se limita aos negócios. Seu nome está ligado também ao debate religioso e moral do tempo, quando se discutiam as condições para a ordenação de seus descendentes. O processo que envolveu seu filho, o padre José Teixeira de Camargo, traz a marca das exigências severas do bispado de Mariana quanto à pureza de sangue, à conduta em quaresma e à fidelidade ao magistério eclesiástico. O peso dessas provas mostra o ambiente em que viviam os primeiros ituanenses, entre o rigor da lei canônica e a necessidade prática de consolidar famílias e patrimônio.
Tomás, ainda solteiro, teve filhos com escravas, como apontam inventários da época. Esses registros revelam a ambiguidade de um homem que, ao mesmo tempo em que participava da fundação religiosa da comunidade, trazia consigo as marcas de uma sociedade assentada na escravidão. Seus filhos com Rosa Rodrigues, Genoveva de Jesus e outros nomes que surgem nos documentos, foram reconhecidos, alguns libertos, outros ligados à descendência oficial por arranjos posteriores. Essa realidade não diminui sua importância histórica, mas a insere no contexto complexo de uma formação social marcada por contrastes.
Mais tarde, Tomás uniu-se de forma legítima à ilustre família dos Camargos de São Paulo, por meio do matrimônio com Maria Cardoso de Camargo. Esse casamento ampliou seu prestígio, ligando-o ao tronco dos fundadores de Ouro Preto e a linhagens que exerceram papel político no período colonial. Dessa união nasceram filhos que perpetuaram o nome e consolidaram a presença da família em Itaúna. Entre eles, destaca-se o já citado padre José Teixeira de Camargo, figura de peso na formação espiritual e jurídica da região, responsável por celebrar uma das primeiras missas na capela de Sant’Ana.
A genealogia se desdobra em nomes que atravessam os séculos e chegam até nós. Os registros indicam filhos como Francisco Teixeira de Camargo, Antonio Teixeira, Maria Madalena Teixeira, além de outros que se espalharam por Minas e São Paulo. Alguns seguiram para o seminário, outros se tornaram proprietários de terras, alguns mantiveram o vínculo com a vida religiosa, consolidando a presença de uma família que não apenas fundava casas e fazendas, mas ajudava a dar forma à organização social da comunidade nascente.
O legado de Tomás Teixeira está registrado ainda em inventários que citam suas posses, as lavras de ouro que explorava, as fazendas que adquiriu e os bens que deixou como herança. Um inventário datado de 1753 aponta o valor de suas dívidas e compromissos, revelando tanto a prosperidade como a fragilidade de um homem envolvido nas lutas econômicas de seu tempo. Ao lado das cifras, aparecem os nomes dos filhos menores, colocados sob a tutela de curadores para que a herança fosse administrada. A história do patrimônio se confunde com a história da própria cidade, pois das terras de Tomás se originaram glebas que sustentaram a expansão agrícola e a fixação de famílias.
Ao percorrer os registros de batismo e casamento, deparamos com a presença constante de Tomás como testemunha e participante de atos comunitários. Ele não foi apenas um proprietário de terras, mas alguém que se tornou referência para a ordem civil e religiosa. Sua proximidade com Gabriel da Silva Pereira e com Francisco de Araújo e Sá compõe a tríade que, em grande medida, estruturou os primeiros passos de Itaúna.
A imagem que dele resta é a de um português que soube transitar entre a rudeza do sertão e a formalidade dos documentos, entre a riqueza das minas e a devoção às capelas, entre as relações com escravas e a nobreza dos casamentos legitimados. A figura de Tomás Teixeira nos fala de uma fundação marcada por ambiguidades, mas também por força criadora. Sua descendência espalhou-se, seus filhos ergueram altares e fazendas, seus netos mantiveram viva a lembrança de um homem que esteve na base da comunidade.
Itaúna nasceu do encontro entre o sonho e a dureza, entre a necessidade prática de abrir picadas e a visão de fundar lugares de oração. Tomás Teixeira permanece como símbolo disso.
Por Rafael Corradi Nogueira