FOLHA Leitor- Opinião

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Boa tarde a todos!

Meu nome é Marci e o que me trouxe aqui hoje foram as minhas convicções políticas e minha experiência profissional na área da educação que soma mais de 34 anos.

Gostaria de apresentar a vocês algumas das minhas preocupações em relação ao Projeto de Lei 130/2023, aprovado por unanimidade pelos vereadores presentes na última reunião, que dispõe sobre a vedação da promoção de temas relacionados ao fomento de ideologia de gênero, sexualização precoce ou qualquer outro incompatível com a faixa etária dos alunos da rede pública ou privada do município de Itaúna.

Primeiramente queria ressaltar que no meu entendimento uma lei só é proposta com o objetivo de vedar algo, quando o objeto da proibição está efetivamente e comprovadamente acontecendo. Então eu pergunto: Vocês embasaram sua decisão a favor da aprovação desse projeto em algum estudo, pesquisa, dissertação de Mestrado, tese de Doutorado que confirme a incidência desses fatos nas escolas do Município? Vocês acreditam que uma peça teatral, palestra, oficina pedagógica ou qualquer outra manifestação semelhante, no âmbito escolar, é capaz de alterar a maneira como o sujeito se vê em relação ao sexo e gênero? Gostaria também que fosse explicitado para nós, educadores, em que consiste a ideologia de gênero na concepção de vocês, porque nos estudos sobre a sexualidade humana, Identidade de gênero não é uma “ideologia” que busca confundir a cabeça das crianças nem “transformar meninos em meninas” ou vice-versa, como andam dizendo por aí. A expressão, na verdade, refere-se à maneira como cada pessoa se enxerga como indivíduo e se expressa na sociedade, independentemente do seu sexo biológico. Ideologia de gênero é uma Fake News criada com objetivos eleitoreiros e está sendo ressuscitada com o mesmo objetivo.

Recentemente assisti a um vídeo de uma apresentação teatral numa igreja evangélica da nossa cidade, onde uma das jovens interpretava o papel de um jovem homem. Será que durante a apresentação dessa peça teatral caseira, os jovens estavam fomentando a tal ideologia de gênero? 

Alguns educadores partilharam comigo dúvidas como: “agora a gente não vai poder fazer uma dramatização para as crianças fazendo papéis masculinos ou femininos? Isso será considerado ideologia de gênero?” e outra “como a escola vai possibilitar às crianças experiências de brincadeira, dramatizações, jogos simbólicos – tão importantes para o desenvolvimento infantil, previstos na Base Nacional Comum Curricular se estamos sendo ameaçados com advertência, suspensão, processo administrativo, perda do cargo?

Quero relembrar a todos que na democracia não existe espaço para censura. A censura é própria de Governos Totalitários. E ainda, a escola pública é para todos: filhos de cristãos, mulçumanos, religiões de matriz africana, filhos de ateus, pobres, ricos, filhos de dois pais, filhos de duas mães, filhos de mãe solo, filhos de pai solo e tantas outras organizações familiares. Portanto, não podemos estabelecer um modelo de comportamento baseado em religião ou ideologia de uma classe social. Lembrem-se o estado é laico.

A criança ou adolescente traz para a escola vivências e experiências que são compartilhadas e contribuem muito para a formação do sujeito. Falar de diversidade é explicar que a sociedade é composta por diversos grupos de pessoas e que estes precisam ser respeitados, independente da orientação sexual, da identidade ou da comunidade que fazem parte. Sejam eles homens, mulheres, crianças, idosos, indígenas, quilombolas, travestis, gays, lésbicas, trabalhadores do campo ou trabalhadores urbanos. Falar de diversidade nas escolas é ensinar às crianças a não terem preconceito nem excluir outras pessoas; é ensinar que é preciso saber acolher e respeitar, porque quando excluímos uma criança dentro da escola, contribuímos para que ela desista dos estudos.

Para os pais que não concordam com essa pluralidade na escola pública, só lhes resta matricular seus filhos numa escola particular que esteja adequada a sua ideologia. 

Para finalizar, é importante dizer que o exercício do magistério impõe muitos desafios. Ser professor, pedagogo, gestor escolar não é fácil. Se tem uma área em que todos dão pitaco é a Educação. De todos os lados, vêm demandas, críticas, sugestões sobre o que, para que, como e quando ensinar. Deixem os educadores cumprirem o seu papel. Foi para isso que estudamos e nos preparamos. Ninguém vai ao mecânico para curar um dente cariado. Quem entende de dente é o dentista. Quem entende de educação são os educadores.

Vocês querem realmente ajudar as crianças e estudantes no que realmente importa? Vamos somar esforços e combater os reais problemas da educação: infrequência, crianças e adolescentes fora da escola, a violência contra os profissionais da educação, o abuso sofrido por crianças e adolescentes e tantas outras mazelas que vivenciamos no dia a dia da escola.

Obrigada.

Marci Gonçalves Campos

31/10/2023