Dia 31 de março ou 1º de abril e a Constituição de 1988
Tudo que sei sobre o Golpe Militar consumado no dia 1º de abril de 1964 – e todas as movimentações antes da fatalidade e as consequências após, com as sequentes perseguições, prisões e mortes, muitas até hoje ainda sem as devidas explicações, além das medidas de fechamento do Congresso Federal, cassação de mandatos de políticos e os movimentos que enchiam as ruas e eram estancados pelas polícias e o exército de forma brusca com cassetetes, tiros e bombas nas principais avenidas das principais capitais e que se espalhavam pelo país – foi lendo, assistindo e ouvindo, afinal, tudo aconteceu dentre 1958 a 1964, portanto eu tinha apenas 4 anos.
Mas tenho lembranças vagas de estar sentado com meu pai ao lado do rádio da família, talvez entre 19 e 21 horas, ouvindo os “repórteres”, creio que em 1966, 1967 e 1968, e ficar intrigado com as reações dele diante das notícias vindas dos grandes centros e da capital federal, Brasília. Vagamente lembro de ouvir nomes como de João Goulart, Castelo Branco, Juscelino Kubitschek, Ranieri Mazzilli, Artur Costa e Silva, Leonel Brizola, Carlos Lacerda, dentre outros.
Já em 1970, então com 10 anos, comecei a entender um pouco do que acontecia ao começar a estudar, cantar o Hino Nacional antes de entrar para a sala de aula, ainda no Grupo Escola Dr. Augusto Gonçalves, ouvir e assistir sobre regime militar e o milagre brasileiro, quando então era presidente o general Emílio Garrastazu Médici, empossado em 1969. Seu governo ficou conhecido como o governo dos anos de chumbo, quando morreram muitos dos que lutavam contra a ditadura militar implantada desde o golpe de 1964. Porém foi aí que comecei a entender o que era governo, política, regime e o que era crescimento econômico, pois naquela época, além das pendengas abusivas, grandes obras foram iniciadas, dentre elas a transamazônica.
Se me lembro bem, então com 12 anos, em 1972, ainda usando calça curta, adentrei pela primeira vez na redação e oficinas do jornal Folha do Oeste, ou jornal do Piu, na Rua Antônio de Matos, número 11, esquina com a Praça Dr. Augusto Gonçalves, ou da Matriz, e a partir daquele momento começava uma história que ainda não teve fim, mas dia a dia tem uma sequência cada vez mais interessante, e foi nessa sequência que comecei a entender o que era de fato um regime militar, o que era ditadura e as suas consequências para o povo, o cidadão comum. E, dia após dia, conhecia quem eram os homens que representavam o poder militar na nossa sempre “Barranqueira” Itaúna e quais dentre eles – uns poucos – lutavam contra aquilo que estava acontecendo no país. Os anos foram passando e percebi que tudo aquilo que li, ouvi e assisti e convivi de perto era necessário naquele momento, mas não podia ter acontecido da forma que aconteceu, e muito menos durar o tempo que durou, com consequências gravíssimas até que pudéssemos gritar, em 1982: VIVA A DEMOCRACIA!!! E que só tem uma frase que expressa os absurdos: DITADURA NUNCA MAIS.
A introdução foi para lembrar que na última segunda-feira, dia 1º de abril, completamos 60 anos daquele Golpe Militar, realizado 1964. E, como afirmado em material enviado ao jornal pelo mestre em Direito do Estado Leonardo de Moraes, professor de Direitos Humanos e autor do romance Tia Beth, sobre as dores da violência no Brasil: “O mais preocupante é perceber que, ainda hoje, boa parte do nosso povo não consegue entender a gravidade de um golpe de Estado e a importância de defendermos a Constituição Brasileira. Afinal, para que ela serve? O que ela realmente é?”. Essas podem até ser perguntas aparentemente corriqueiras, mas essas noções jurídicas básicas de Direito são fundamentais na formação cultural e educacional de um povo, e mereciam ter tido e ter mais atenção nas escolas, porque a Constituição de um país é o seu “pacto social”, a base da construção da nossa vida como ela é, evitando a anarquia, o caos social e a guerra.
Então, no dia 25 de março, denominado o “Dia da Constituição”, deveríamos ter comemorado, pois foi ela que possibilitou este Brasil onde vivemos, que, mesmo cheio de problemas, ainda prevalece as regras e o respeito, e isso ficou provado na tentativa frustrada de alguns políticos despreparados e uns poucos militares de categoria duvidosa em tentar um golpe de Estado no ano passado, apoiados por uma porcentagem ínfima da população.
Nossa Constituição promulgada em 1988, pelo então deputado Ulisses Guimarães, é que assegura os direitos fundamentais e o Estado de Direito do cidadão, que, mesmo tendo de enfrentar todos os tipos de problemas de ordem social e financeira num país ainda de economia instável, pelo menos tem seus direitos fundamentais garantidos, apesar das “lambanças” constantes da maioria dos nossos políticos.
Para finalizar, volto à opinião do citado mestre em Direito Leonardo Morais, que afirma ser muito triste constatar que parte considerável não percebeu o risco que correu no ano passado e que ainda não entendeu que a liberdade e o Estado de Direito são inegociáveis. E finalizou: “Toda história se repete em ciclos, a menos que amadureçamos. Nos resta sonhar que, com um aprendizado reforçado em Direitos Humanos, as futuras gerações se libertem da tentação em apoiar esse tipo de disparate político, e que nunca mais o Brasil sofra esse tipo de agressão, como há 60 anos, ou há apenas duas folhas do calendário”. Pois é!