Nosso sistema educacional está boicotando nossas crianças
Nosso sistema educacional pune tentativas erradas e oferece estrelinhas para os jovens que se tornam bons depósitos de alfabetização. Nossas escolas premiam quem memoriza blocos de informações que daqui a dez anos estarão ultrapassadas. Por fim, a Educação que oferecemos para nossas crianças não leva em consideração a extraordinária amplitude de habilidade delas. Tenho a honra de apresentar a instigante reflexão de Sir Ken Robinson, recentemente falecido, teórico da Educação mais criativa e inovadora.
As crianças entrando na escola esse ano se aposentarão na década de 2060. Até lá, a imprevisibilidade do mundo é enorme. Por isso, precisamos falar sobre educação, sobretudo sobre criatividade. A criatividade hoje é tão importante na educação quanto a alfabetização.
Criança não tem medo de errar. Não significa que estar errado é o mesmo que ser criativo. O que sabemos é que se você não estiver preparado para errar, você nunca terá uma ideia original. E quando chegam a fase adulta, a maioria das crianças já perdeu essa capacidade. Elas têm pavor de estarem erradas. E as empresas são administradas assim. Nós estigmatizamos os erros. E hoje administramos os sistemas educacionais de um jeito em que errar é a pior coisa que pode acontecer. O resultado disso é que estamos educando as pessoas para serem menos criativas. Picasso disse uma vez que todas as crianças nascem artistas. O problema é permanecer artista enquanto crescemos. Não aumentamos nossa criatividade: nós a diminuímos. Ou melhor, somos educados a abandoná-la.
Não existe um sistema educacional no planeta que ensina dança diariamente às crianças da mesma forma que ensina matemática. À medida que as crianças crescem, nós começamos a educá-las progressivamente da cintura para cima. E depois nos focamos na cabeça. E, na sequência, o foco é levemente forçado para um lado. Se um ET visitasse nossas escolas e perguntasse: “Para que serve a Educação?”. A conclusão obrigatória seria, olhando para o resultado de quem é bem-sucedido, de quem ganha as estrelinhas, de que o objetivo da Educação ao redor do mundo é produzir professores universitários. Nosso sistema educacional atual se baseia na ideia da habilidade acadêmica. Não existiam sistemas públicos de educação antes do Séc. XIX. Todos eles foram criados para atender a demanda da industrialização. Então a hierarquia está apoiada em duas ideias. A primeira é que as disciplinas mais úteis para o trabalho estão no topo. Então você era bondosamente afastado na escola quando era criança de certas coisas, coisas que gostava, com a premissa que você nunca iria conseguir um emprego fazendo aquilo. “Não faça música, você não vai ser músico. Não faça arte, você não vai ser artista”. Conselho bem-intencionado. Hoje, profundamente errado. O mundo inteiro está envolto numa revolução. A segunda é a aptidão acadêmica, que veio a dominar nossa visão de inteligência, porque as universidades planejaram o sistema a sua própria imagem. Se você for pensar, todo o sistema de educação ao redor do mundo é uma extensão do processo de ingresso à universidade. A consequência disso é que muitas pessoas altamente talentosas brilhantes e criativas, pensam que não o são, porque aquilo que elas eram boas na escola não era valorizado, ou era até estigmatizado.
Precisamos repensar radicalmente nossa visão de inteligência. Sabemos três coisas sobre inteligência. Um: é variada. Pensamos a respeito do mundo de todas as formas que o vivenciamos. Pensamos visualmente, pensamos auditivamente, pensamos cinestesicamente. Pensamos em termos abstratos, pensamos em movimento. Dois: inteligência é dinâmica. Se formos olhar as interações do cérebro humano, conforme ouvimos ontem em várias apresentações, a inteligência é maravilhosamente interativa. O cérebro não se divide em compartimentos. De fato, criatividade, que é o processo de ter ideias originais de grande valor, com bastante frequência se manifesta por meio da interação de como as diferentes disciplinas se interagem na visão das coisas. O terceiro ponto sobre a inteligência é que ela é distinta. Gillian Lynne, é uma coreógrafa famosa. Ela conta que quando estava na escola, desanimada, nos anos 1930, sua escola escreveu para os pais dizendo que ela tinha dificuldade de aprendizado. Ela não conseguia se concentrar, era inquieta. Hoje provavelmente diriam que ela tinha TDAH. Mas eram os anos 30, e TDAH não tinha sido inventado ainda. Não era uma doença disponível. As pessoas não sabiam que podiam ter aquilo. Então a mandaram para um especialista. No final o médico pediu que Gillian esperasse só, enquanto ele falava com sua mãe. Mas enquanto eles saiam da sala, ele ligou o rádio que estava sobre a mesa. Assim que eles deixaram a sala, ela disse, ela estava de pé, se movendo com a música. Eles observaram por alguns minutos e ele se virou para a mãe e disse que ela não estava doente, que ela era uma dançarina e deveria investir naquilo. Ela eventualmente fez um teste para a Royal Ballet School, se tornou uma solista e teve uma carreira fantástica. Foi responsável por alguns dos musicais mais bem-sucedidos na história, deu alegria para milhões, e é multimilionária. Outra pessoa poderia ter receitado um remédio e dito para ela se acalmar.
Nosso sistema educacional explorou nossas mentes como exploramos a terra: em busca de um recurso específico. E para o futuro, isso não serve. Temos que repensar os princípios fundamentais que baseamos a educação de nossas crianças.