Dicas para melhorar seu poder de negociação

Dicas para melhorar seu poder de negociação


Sua vida é uma eterna sessão de negociação. Da ida à padaria ao expediente de trabalho, passando pelo churrasco com amigos deste sábado. Sabe aquela pergunta de infância sobre qual superpoder gostaríamos de ter? Por que voar ou ficar invisível, se poderíamos carregar a magia de negociar infalivelmente e convencer todos vilões a nos escutarem? 

Ao longo dos últimos 17 anos, trabalho negociando dentro do ambiente político e corporativo. Sobre os mais variados temas, com políticos e executivos, nos mais diversos níveis de poder. A única coisa igual sempre é o fato de haver um ser humano em cada ponta da conversa.

Há alguns anos, Fisher e Ury escreveram um manual sobre “Como chegar ao Sim”. Como boa parte dos analistas políticos, eles defenderam que era possível domar o cérebro emocional das pessoas, por meio de uma resolução racional. Até a famosa Universidade de Harvard comprou a ideia, em seu curso sobre negociação. Seria possível dobrar qualquer um seguindo quatro passos. Um: separamos nosso interlocutor do problema. Dois: não nos deixamos envolver pelo que o outro lado pede, a fim de descobrirmos o motivo de pedirem. Três: cooperamos, para criar opções. Quatro: chegamos a opções de acordos mútuos. Receita fantástica no papel. Mas um desastre na vida real. Afinal, o ser humano não é puramente racional e, portanto, não separará sua tomada de decisão do comportamento emocional. Chris Voss, ex-chefe de negociação do FBI, concluiu isso na prática, entre um sequestro e um roubo a banco. Eis o que eu aprendi com ele.

Harvard ensinava que o outro lado de uma negociação sempre age de forma racional e egoísta, para ampliar sua posição. O psicólogo Daniel Kahneman, autor do best-seller “Rápido e Devagar”, confrontou isso mostrando que as escolhas das pessoas não são estáveis. Em razão de vieses cognitivos que distorcem momentaneamente como vemos o mundo. Isso ocorre, por exemplo, quando vemos as pessoas darem mais valor à diferença entre 90% e 100%, numa probabilidade qualquer, do que entre 45% e 55% - embora exista os mesmos 10%. Ou quando a aversão à perda é mais provocante do que a possibilidade ao ganho.

Assim, antes de focar no objeto da negociação, abrace a condição comportamental do outro, em vez de isolá-la do processo negociação. E junto com isso, dê férias para seu ego. O seu objetivo não é parecer que ganhou, ao final. Mas fazer com que o outro se sinta assim, enquanto seu objetivo é alcançado. Assim, você precisará acalmar pessoas, estabelecer compreensão, ganhar confiança, estimular a verbalização de necessidades e convencê-las de sua empatia. Por isso, o primeiro passo não é começar pelo que você quer ou pelo que se pensa, mas sim por uma escuta ativa. Você precisa descobrir o que o outro quer verdadeiramente. Valide o que o outro sente. Torne-se um espelho da atitude que o outro lhe oferece: imite seu padrão de fala, linguagem corporal, vocabulário, ritmo e tom de voz. Silêncio com pausas eficazes e uma voz amena, mas confiante, também diminuirão qualquer cenário esquizofrênico de tensão e permitirão que o outro comece realmente a prestar atenção em você.

Siga para a criação de uma empatia tática. Nomeie e deixe claro os sentimentos do outro que você perceber. Esta rotulagem sincera valorizará a perspectiva de seu interlocutor. Se houver reclamações, acusações e esqueletos no armário que o outro possa tentar usar contra você para o tornar vulnerável ou zombá-lo, escancare tudo no primeiro momento da conversa antes que ele o faça. Esta auditoria de acusações molhará a pólvora do interlocutor. Faça isso de maneira elegante, altiva e humilde. Use expressões, de forma sincera, como: “Parece-me que eu sou muito considerado em razão disso...”, “Entendo que você me enxerga dessa e dessa maneira...”, “A maneira com que fizemos isso, pode mesmo transmitir a impressão de...”.

Domine a capacidade de extrair uma negativa do outro. Toda verdadeira negociação começa com o outro lado negando algo. Quando você estimula a autonomia do outro para que ele possa lhe dizer não, as ideias e emoções dele se acalmam, a eficácia das decisões aumenta e ele de fato passa a analisar sua proposta. Um sim precoce é apenas uma evasiva. Igual à que você dá para o vendedor de telemarketing que te liga ou te aborda na porta do supermercado, decidido a extrair o primeiro sim de sua boca.

Sair do seu ego e negociar no mundo do seu interlocutor é a única maneira de chegar a um acordo que o outro lado cumprirá efetivamente. É um gol de placa levar o outro lado a te oferecer um “está certo”, ou um “é isso mesmo”. Repita com suas próprias palavras, todo o roteiro e sentimento do seu interlocutor. Quando ele disser que “está certo”, ele sentirá ter avaliado o que você disse e declarado que era a coisa certa de livre e espontânea vontade.

Incline a realidade do seu interlocutor, nesta negociação. Traga o conceito de justiça para a conversa. E seja sincero. Nenhum ser humano se sente confortável com a mera possibilidade de injustiça. Descubra os mecanismos emocionais daquilo que o outra busca. E os enquadre na sua proposta. Uma babá não vende “cuidar de crianças”, na realidade ela vende “comodidade e tranquilidade para os pais”. Ancore as emoções do outro no pior cenário. Isso o fará ter aversão à perda total, quando considerar abrir mão de algo que você oferecer e pode parecer pouco. Deixe o outro falar primeiro. Use uma faixa de valores, para sair de perguntas ‘queima-roupa’ sobre um valor. Quando falar em número, seja preciso nos centavos. Número terminados em zero, passam a impressão de serem temporários e barganháveis.

Por fim, ainda que possamos seguir por mais alguns pontos intrigantes, toda negociação de excelência deveria ser uma caça ao Cisne Negro: um ou mais fatos relacionados ao outro, questões que têm o poder de mudar irracionalmente o rumo de absolutamente tudo. Pontos que só podem ser descobertos por meio de perguntas calibradas que fazemos para substituir respostas simples de sim ou não, por explicações complexas de como, por que ou quando. Dez minutos com alguém revelam mais do que dez dias de pesquisa. Momentos de relaxamento, no começo ou no fim da conversa, quando se diz algo fora do contexto, podem oferecer a chave definidora de uma negociação.

Por: Rafael Corradi