Cidade Educativa: A Comissão Julgadora em Itaúna

A cidade se preparou como quem espera visita importante. O rumor atravessava as manhãs de rádio, os jornais de papel fino, os cochichos nos balcões de padaria. Restavam apenas 19 municípios mineiros na disputa e os olhos do Estado se voltavam para as cidades semifinalistas. Itaúna, no centro da cena, respirava o desafio como quem respira seu próprio ofício. Não se tratava apenas de vencer. Tratava-se de afirmar o que já se era.
Uma comissão composta por especialistas do Brasil e do exterior (gente das universidades, dos conselhos de educação, dos jornais, até da Organização dos Estados Americanos) viria conferir, com olhos próprios, aquilo que por anos se cultivou em silêncio. A comissão pisaria em solo itaunense para ver de perto se havia verdade no que os relatórios apontavam. Era a cidade sendo olhada por dentro.
As imagens da época falam antes da escrita. Sobem a rua Silva Jardim, no coração de Itaúna, homens e mulheres de diferentes idades, rostos esperançosos e braços erguidos em aplauso. A Silva Jardim, por um instante, deixou de ser passagem para se tornar palco. No centro da cena, a Comissão Julgadora do Projeto Cidade Educativa avançava sob os olhos da multidão, que fazia daquele momento algo maior do que uma disputa entre municípios. Era a cidade inteira subindo a avenida junto, afirmando com os próprios pés o valor de sua trajetória.
E foi assim que Itaúna reagiu. Sem improviso, sem maquiagem, sem espetáculo. Apresentou-se com a dignidade de quem conhece suas raízes. Levou à comissão não apenas números, mas histórias. Não apenas estatísticas, mas afetos. Reuniu seus mestres, seus arquivos, seus estudantes, seus músicos. O que se viu nas ruas e nos espaços públicos foi mais que uma campanha. Foi um ato de fé coletiva.
Ao redor da mesa do Rancho Guarany, partilharam almoço figuras que, em outra ocasião, talvez nem se cruzassem: juiz de paz, delegado, sargento, padre, professores, líderes comunitários. O gesto simples de dividir o pão tornou-se símbolo de um pacto maior. A cidade reunia suas forças. A cidade lembrava que educar é, antes de tudo, construir convivência.
Jesus Ferreira e Affonso de Cerqueira Lima entoaram canções como se traduzissem em som aquilo que as palavras não alcançam. Não estavam se apresentando musicalmente por formalidade, mas por pertencimento. Tocavam como quem planta. Cantavam como quem ora. A cidade escutava. E no silêncio da escuta, firmava-se o vínculo.
A visita da comissão não foi teatro. O que se mostrou era o que sempre se viveu. A educação em Itaúna vinha das salas de aula e dos gestos cotidianos. Vinha das lideranças locais, mas também do esforço anônimo das mães que acompanhavam as lições dos filhos. Vinha dos planos de governo e das convicções guardadas em casa.
O espírito comunitário saltou aos olhos dos avaliadores. A cidade era mais que um conjunto de escolas. Era um território de pertencimento. Era uma rede de confiança. Era um lugar onde os jovens sabiam que tinham lugar. E onde os velhos sabiam que sua memória contava.
A comissão se emocionou ao ouvir o coral de Santanense, o monólogo apresentado pelos alunos do Colégio Estadual e pelos atores de teatro do Colégio Sant’Ana. Viu nos olhos dos estudantes uma esperança sem simulação. Leu nos rostos dos professores uma serenidade antiga. Reconheceu nos discursos dos líderes um senso de dever que não se improvisa. Não era preciso convencer ninguém. Bastava mostrar o que se era.
As palavras do prefeito Hildebrando Canabrava Rodrigues, do reitor fundador da Universidade de Itaúna, Guaracy de Castro Nogueira, e de tantos outros que falaram à cidade pela rádio e pelos microfones públicos não tinham tom de apelo. Tinham tom de gratidão. Tinham o peso leve da verdade. Reconheciam que Itaúna não chegou ali sozinha. Chegou com o suor dos que vieram antes. Com o esforço de cada educador, de cada dirigente de bairro, de cada cidadão que acreditou que educação era coisa séria.
No Fórum, os estudantes de Direito e Engenharia erguiam faixas, exibiam presença, davam corpo ao sonho coletivo. Não se tratava de torcer por um prêmio. Tratava-se de celebrar um processo. O reconhecimento viria depois. O que importava, naquele instante, era a consciência do caminho.