POLÊMICA NA SAÚDE - Hospital sob risco de intervenção
Após críticas de prefeito de Itatiaiuçu, caso ganhou amplitude com o falecimento de criança e reclamações de populares. Assunto foi pauta da reunião dos vereadores

O hospital de Itaúna, mantido pela Casa de Caridade Manoel Gonçalves de Sousa Moreira, é único na cidade e credenciado ainda para atender os municípios da microrregião, composta por Itatiaiuçu, Itaguara e Piracema. Há vários anos, décadas, a situação financeira da instituição apresenta dificuldades, agravada nos últimos tempos, especialmente após a administração passada de Itaúna, sob comando do ex-prefeito Neider Moreira, ter deixado de repassar valor de cerca de R$ 6 milhões, conforme havia sido acertado, segundo denúncias de vereadores.
Na atualidade, o hospital trabalha com déficit mensal de cerca de R$ 500 mil/mês, que, segundo informações, também de vereadores, seria causado no atendimento feito com o pronto-socorro, que é de responsabilidade do Município. Porém, para entender a questão, é preciso esclarecer que o pronto-socorro do Hospital Manoel Gonçalves e o Plantão 24 Horas, bancado pela Prefeitura de Itaúna, funcionam em um mesmo local e espaço. Para o funcionamento do Plantão, a Prefeitura tem um convênio assinado, com repasses mensais para a manutenção do local.
O problema, como apontou o vereador Alexandre Campos, na terça-feira, 29, é que o atendimento no pronto-socorro/plantão gera um déficit mensal de R$ 500 mil. Isso porque o hospital atende aos casos que chegam e o atendimento ultrapassa o contratado junto ao SUS, da mesma maneira que excede o valor pago pela Prefeitura, para o funcionamento do Plantão. São R$ 6 milhões de prejuízos anuais, sem uma fonte de arrecadação para tanto. Por outro lado, não há como parar o atendimento quando se alcança o limite da cota contratada ao SUS e os valores repassados pela Prefeitura. Esse problema vem se avolumando e, nesta semana, explodiu, a partir de uma reclamação pública feita pelo prefeito de Itatiaiuçu e a morte de um bebê durante o parto.
A crítica do prefeito
No dia 24 de abril, Romer Soares, em tom de desabafo e denúncia, criticou o atendimento do hospital de Itaúna e destacou o interesse em mudar de hospital de referência da microrregião, caso seja possível e caso não haja mudanças na situação. Em sua fala, ele ressaltou, inclusive, que contribui financeiramente com o hospital, ajudando sempre que a gestão precisa, mas que o atendimento não é recíproco, com falta de acolhimento e respeito aos moradores de Itatiaiuçu. O vídeo gerou repercussão em toda a região e, através das redes sociais, a população itatiaiuçuense, além de muitos itaunenses postaram comentários nas redes, destacando casos de negligência e descaso, com acusações ao hospital, em diferentes situações.
O problema ganhou corpo cinco dias depois, no dia 29, quando veio à tona outra denúncia, desta feita, envolvendo acusação de negligência médica em um parto de bebê. A avó foi às redes sociais denunciar o caso que teria resultado na morte do neto, no domingo, dia 27. A mulher aponta que a filha deu entrada no hospital no início da manhã do domingo e ficou em trabalho de parto até por volta de 17h30, quando foi transferida para uma “cesárea de urgência”.
Em resposta, ainda na terça-feira, dia 29, a direção do Hospital Manoel Gonçalves publicou nota técnica de esclarecimento, afirmando que o caso será apurado. A nota afirma ainda que o atendimento e critérios de internação são realizados conforme determinação do SUS, incluindo a seleção dos pacientes por gravidade, conforme o Protocolo de Manchester.
À reportagem da FOLHA, o prefeito de Itatiaiuçu informou que se reuniu com o secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais, Fábio Baccheretti, na segunda-feira, dia 28, que prometeu a ele mandar realizar auditoria no hospital, com possibilidade, inclusive, de intervenção caso sejam confirmadas as denúncias. Conforme o prefeito de Itatiaiuçu, Romer Soares, que estava acompanhado da vice-prefeita Adriana Camargos, o secretário de Estado foi bastante receptivo às suas reivindicações e garantiu que o Estado vai apurar detalhadamente a situação. O encontro teria contado ainda com a presença da assessoria do deputado estadual João Vítor Xavier.
Comissão de Saúde da Câmara apurando
Ainda na terça-feira, dia 29, a Romer e a vice-prefeita de Itatiaiuçu, Adriana Camargos, se reuniram com os vereadores de Itaúna Rosse Andrade e Wenderson da Usina, membros da Comissão de Saúde da Câmara, para ampliar o diálogo e a cooperação entre os municípios. Conforme divulgado, Romer expôs toda a situação com o hospital de Itaúna, com o objetivo de melhorar o atual cenário da saúde nos municípios e se dispôs aberto ao diálogo.
Rosse e Wenderson contemporizaram pela necessidade de se apurar todo o ocorrido, inclusive e especialmente, no caso da acusação sobre a possível negligência médica, apelando ao diálogo entre as partes. A argumentação dos vereadores itaunenses, repetida na Câmara, na reunião da edilidade, é de que é preciso buscar solução, com diálogo e ação efetiva das partes, na busca de um resultado comum e satisfatório às comunidades. O prefeito, a vice e os vereadores gravaram vídeo, que foi postado nas redes sociais, propondo o debate e a busca por uma solução de consenso.
À reportagem da FOLHA, Romer reiterou que está aberto ao diálogo, com interesse em resolver a situação da melhor forma possível. Afirmou ainda que está disposto a fazer o que for necessário para que a população de Itatiaiuçu seja atendida, garantindo um sistema de saúde que priorize o bem-estar de todos.
Na Câmara “a politicagem imperou”, segundo os comentários
Na reunião da Câmara de Itaúna, na terça-feira, 29, vários vereadores se manifestaram sobre o tema. De um lado, propostas de diálogo, de análise da situação e de busca de solução. De outro, discursos inflamados e fora do controle, que “colocaram lenha no fogo”, conforme a avaliação de pessoas que acompanharam o debate. O edil Kaio Guimarães falou que vai “apurar e que os culpados sejam punidos”. Alexandre Campos partiu para cima do discurso do prefeito de Itatiaiuçu, de forma grosseira e aos gritos, nas duas intervenções mais “quentes” do debate. Na opinião de muitos o discurso foi injusto, e feito de forma não agregadora, pelo contrário.
Rosse e Wenderson repetiram a postura do encontro com o prefeito da vizinha cidade, com afirmações de que a Comissão de Saúde vai apurar a denúncia, mas que o melhor a fazer, no momento, não era debater as críticas, mas buscar solução para problemas. O problema persiste, porém, já que o mês de abril chegou ao seu final e o hospital acumulou mais R$ 500 mil de prejuízos.
A fala da vereadora Márcia Cristina, ainda abordando a reunião da Câmara, aponta um problema que vem se avolumando ao longo dos últimos anos: conforme ela esclareceu, em levantamento feito nas unidades de saúde de Itaúna, o agendamento de consultas continua sendo um gargalo na saúde itaunense. Dados informados por ela são de que a consulta com data mais próxima em um PSF da cidade seria para o final do mês de maio. A maioria dos PSFs está agendando consultas para a segunda quinzena de junho e existem casos que o usuário deve esperar para ser atendido somente em julho.
Com isso, a saída para quem precisa de atendimento médico para o seu problema é esperar, correndo o risco de agravar o seu estado de saúde, ou ir para o Plantão 24 Horas. Certamente, a segunda opção será a escolhida, em grande parte dos casos, e, assim, os déficits vão se acumulando. “Não investimos em prevenção e ficamos tentando socorrer no momento crítico”, resumiu o vereador Rosse Andrade.