O mapa e o tabuleiro: uma reflexão para os Vereadores de Itaúna

O mapa e o tabuleiro: uma reflexão  para os Vereadores de Itaúna

Converso frequentemente com diferentes vereadores de nossa querida Itaúna. Admiro qualquer pessoa que decida enfrentar uma eleição. É um caminho de vida extremamente invasivo. Mas nobre, embora muito atacado. A democracia não é sobre estar preparado tecnicamente, mas sobre ter legitimidade de uma parte da população que escolhe alguém para ser sua voz. Mas para conseguir fazer isso, quem chega lá precisa conseguir fluir por entre os diversos interesses de outros eleitos. É uma estrada de chão, cuja escola está na capacidade de observar o entorno e ficar rouco de tanto escutar.

Entre uma e outra conversa com políticos, às vezes me pedem opinião. Este texto de hoje é isso. Um compilado de palpites que já dei em conversas. É uma reflexão sobre as ferramentas políticas que tradicionalmente vejo serem esquecidas nas nossas Barrancas do São João.

Penso que na política, tão importante quanto mover as peças é escolher em quais batalhas se entra. O erro mais comum em política é reagir em vez de conduzir, lutar o duelo que o outro marcou, com as regras que o outro impôs. Todo poder começa pela capacidade de escolher o terreno da disputa. Quem define o campo, define o ritmo. E quem define o ritmo, quase sempre, vence.

O jogo político não é sobre bravura nem pureza ideológica; é sobre direção. É preciso saber de onde se parte e, sobretudo, para onde se quer chegar com cada confronto. Há lutas que elevam e outras que apenas consomem energia. O poder, para quem o compreende, não se mede por quantas guerras se vence, mas por quantas se evita. A força está em transformar o inevitável em palco e o adversário em mola propulsora. 

Os que se lançam em todas as disputas com a espada desembainhada confundem coragem com necessidade de aprovação. O verdadeiro jogador não se move por impulso. Ele observa. Mede. Espera. E quando age, o faz de modo a parecer natural, quase inevitável. Parecer calmo quando se prepara o golpe, parecer distraído quando se constrói o cerco. A política é uma arte de presença disfarçada. E a ausência bem calculada, às vezes, vale mais que o discurso inflamado.

Há poder em não estar em tudo. A ausência é o espaço onde a imaginação do outro trabalha a seu favor. Quem se mostra em excesso perde mistério, e o mistério é a forma mais antiga de autoridade. A presença constante desgasta o símbolo. Os que entendem isso dominam o tempo de aparecer e o tempo de recuar. O silêncio e o intervalo são instrumentos de persuasão. 

Escolher as batalhas também é escolher quando ser visto. O jogo político não tolera neutralidade: quem se apaga por medo é esquecido, e quem é esquecido perde poder. Mas há diferença entre visibilidade e exposição. Estar no foco é uma decisão tática, não um reflexo. Às vezes é preciso provocar, gerar desconforto, atrair olhares. Não pela vaidade da notoriedade, mas pela necessidade de dominar o enredo. Quem não controla a narrativa, cedo ou tarde, será escrito por ela.

A política é feita de sombras e holofotes. O erro dos ingênuos é pensar que basta ser bom; o erro dos cínicos é acreditar que basta ser visto. É importante equilibrar os dois. Fala o suficiente para guiar, nunca o bastante para se decifrar. Quem revela o jogo perde o controle da mesa. É importante preservar a própria margem de manobra. A discrição é uma ação invisível, mas profundamente ativa.

E quando chega o momento de agir, é o tempo que separa o habilidoso do precipitado. Há quem saiba o que fazer, mas não saiba quando. A ação errada na hora certa é erro; a ação certa na hora errada é desastre. O tempo é o verdadeiro árbitro do poder. Saber esperar é mais do que paciência: é domínio emocional, percepção fina do ambiente, leitura de marés. O político que domina o timing não corre, conduz. E quando o relógio marca o instante exato, ele se move sem hesitação, como se o destino o empurrasse.

Ainda assim, nenhuma estratégia é estática. O poder é uma matéria viva. Aqueles que se apegam demais às fórmulas morrem com elas. O político sábio aprende a adotar a forma fluida: fluir sem perder substância, adaptar-se sem dissolver-se. Há momentos em que é preciso ser rio, abrindo caminho com calma; outros em que se torna mar, recolhendo forças nas profundezas. Flexibilidade não é fraqueza; é sobrevivência. O rígido quebra, o fluido contorna e permanece.

E no centro de tudo, volta a lição inicial: escolher as próprias batalhas. Cada confronto deve ter um propósito, um cálculo de ganho e perda. Entrar em uma disputa é abrir mão de energia, reputação e tempo. É fundamental decidir com precisão quase cirúrgica onde sangrar. A prudência é uma forma de força. Quem luta por impulso alimenta o jogo alheio; quem luta por estratégia impõe o próprio.

No fim, o poder não pertence ao mais forte nem ao mais visível. Pertence ao que compreende o jogo e sabe quando jogar. A política é o espaço da coreografia, da presença e da ausência, do gesto e da pausa. O tabuleiro muda, os rostos também, mas o mapa permanece o mesmo: quem sabe onde está e para onde vai, governa o caminho. E quem governa o caminho, mesmo quando perde, nunca deixa de avançar.

Por Rafael Corradi Nogueira