ISTO E AQUILO

ISTO E AQUILO
Domínio Público/Wikipedia Commons


Há uma tendência, um tanto machista de se encarar o perigo, de dar a cara ao fogo, mesmo que isso envolva riscos. O primeiro soldado brasileiro a morrer na Segunda Guerra Mundial foi um certo Tatão, um valentão que dominava o bairro da Floresta, em BH. Deve ter colocado a cabeça pra fora da trincheira e gritado: “Quem manda aqui sou e......”. 

A sabedoria chinesa aconselha: diante de um perigo extremo, corra! Essa atitude tem raízes profundas na filosofia oriental. Para os chineses, mais do que ser herói ou do que reafirmar um valor moral, uma tradição de comportamento, a sabedoria está em resolver a situação que se apresenta, em sanar o problema na sua frente. Você até pode pegar o touro a unha, mas a opção de bater em retirada é igualmente legítima, especialmente se a sua prioridade for não ser chifrado.  

Nós, ocidentais, estamos sempre preocupados com o falso e o verdadeiro, com a nobreza e a covardia. Tudo deve estar de acordo com regras determinadas pela tradição, pelo hábito ou por alguma ideologia, geralmente impermeável e absoluta. 

Os chineses não agem assim. Longe de se preocuparem com alguma coerência genérica, pensam no caminhar e na melhor maneira de garantir o movimento pra frente. Por isso admitem situações ambíguas, flexibilizam definições excludentes e reavaliam valores. Com frequência, e você já percebeu isso vida afora, as coisas podem ser assim e assado, ao mesmo tempo. 

A mentalidade ocidental tem dificuldades de conviver com tais situações. Somos azul ou rosa. Somos esquerda ou direita. Ponto. Mas veja a China. Ela é comunista ou capitalista? 

A Revolução Comunista teve início em 1949, com Mao Tsé Tung, e em 1978, com Deng Xiaoping, o país mudou de direção, adotando estratégias capitalistas, sem deixar de ser comunista. “Não importa se o gato é preto ou branco, desde que cace ratos!”, disse Deng num encontro do Partido Comunista. 

O governo chinês tem traços autoritários, mas retirar 780 milhões de pessoas da pobreza é buscar o bem comum, o oposto da geração de privilégios que costuma acompanhar os regimes totalitários. A China era um país pobre e, para piorar, entre 1949 e 1976, foi devastada pela guerra civil. Entretanto, nos 47 anos seguintes, se transformou na segunda maior economia do planeta e será a primeira nos próximos anos. Hoje ela tem 700 bilionários e quatro milhões e meio de milionários! O salto foi monumental. 

Forjado por Deng Xiaoping e o seu círculo, o fundamento que diz que “a prática é o único critério para a verdade” inspira o admirável progresso chinês há quase meio século. Talvez seja hora de sermos mais pragmáticos e de perdermos o medo de ir pro inferno por adotarmos posições fora da ordem. 

Entretanto assumir uma autodeterminação que seja sadia implica na percepção apurada da realidade e supõe uma consciência elevada sobre que sociedade nós somos, de fato. É aí que começam os nossos problemas.

Sérgio Márcio Machado