É muita água, mas com distribuição e uso desigual

País tem 12% das reservas de água doce do mundo, mas uso é irracional. Itaúna voltou a sofrer com falta de água e problema parece sem solução

É muita água, mas com distribuição e uso desigual


Um seminário para debater o combate à escassez hídrica foi realizado em Brasília, na segunda-feira. A questão da necessidade de uma utilização mais racional do recurso foi o tema principal do debate. O Brasil tem a maior reserva de água doce do mundo – 12% do total –, mas a utilização deste recurso é feita de maneira desproporcional, com o agro utilizando 70%, a indústria, 20%, e o uso doméstico consumindo os outros 10%, em número “redondos”. O pagamento pelo uso, porém, é registrado de forma inversa, com a população pagando cada dia mais caro pelo uso da água e os demais consumidores pagando bem menos, proporcionalmente, pelo uso. Na maioria dos casos, inclusive, o uso da água nem é pago, conforme questionam ambientalistas.

Conforme dados da agência de jornalismo investigativo Pública, o agronegócio brasileiro é o maior consumidor de água, com 1.474 bilhões de litros por ano. Em seguida vem o setor sucroalcooleiro, com consumo de 1.242 bilhões de litros/ano. O terceiro maior consumo é do setor de papel e celulose, com 977 bilhões de litros. A geração de energia consome 598 bilhões de litros/ano; a siderurgia, 250 bilhões de litros/ano; a área da logística, mais 195 bilhões; a mineração, 150; e a aquicultura, 51 bilhões. Não existe uma informação de quanto esses setores pagam pelo uso da água. 

Um grande problema, que poderia ser melhorado caso houvesse o investimento necessário dos produtores, é com relação à irrigação de plantios. A irrigação, conforme informações da ANA – Agência Nacional de Águas, é o setor que mais retira água dos mananciais, com 1.083 m3/segundo, conforme dados de 2017. Já o consumo com o abastecimento urbano, no mesmo período, utilizou 496,2 m3/segundo. Porém, quando se analisa o pagamento por este uso, é possível detectar que cerca de 95% do uso urbano é remunerado, o que não se repete na questão da irrigação, por exemplo, se repetindo nos vários outros setores de alto consumo.

Ainda em relação à agência Pública, uma informação assusta: 60 empresas podem usar a mesma quantidade de água que a metade do Brasil, conforme pode ser conferido no endereço eletrônico https://apublica.org/2023/10/os-donos-da-agua-50-empresas-podem-usar-mesma-quantidade-que-metade-do-brasil/.  

Como economizar

Além do que se propõe no meio urbano, do uso consciente da água, é necessário que o mesmo trabalho seja realizado junto aos setores do alto consumo. Na questão da irrigação, por exemplo, a troca de modelo de aspersão por gotejamento representaria economia no uso de cerca de 50%, pelo menos, conforme técnicos da área. A reutilização, ou reuso, da água seria outro caminho. Porém a necessidade de investimento para se chegar a essas condições esbarra na necessidade de obtenção de lucro. Quanto mais produção com menos valor investido é o que interessa ao mercado.

Perda de água nas áreas urbanas

Já em relação ao consumo nas áreas urbanas, investimento em tecnologia de combate à perda de água poderia ser um caminho. No caso de Itaúna, por exemplo, com uma rápida leitura nos números apresentados pela autarquia SAAE, no seu site, dá para calcular que, com investimento, o problema da falta de água seria solucionado. Constam duas adutoras de água bruta com captação na barragem: uma com capacidade de adução de 177l/s e outra de 230l/s (l/s= litros por segundo).

Já a capacidade de tratamento da ETA é de 316,21 l/s. Assim podem ser captados 407 litros por segundo e tratados 316,2, sendo que mais de 90 litros por segundo devem ser devolvidos aos mananciais. Essa água poderia ser tratada e direcionada a comunidades onde existe a falta do produto, conforme técnicos. Como a rede de distribuição necessita de altos investimentos, essa água poderia ser levada por meio de caminhões-pipa, abastecendo reservatórios. Porém não há proposta nesse sentido, pelo menos na atualidade, no SAAE. Mas a perda de água tratada é na mesma proporção, com alto volume sendo perdido no trajeto da Estação de Tratamento de Água – ETA até os reservatórios e, destes, até as torneiras dos imóveis. E não se vê um trabalho sistemático do SAAE para inibir essa perda. Enquanto isso, perdura o uso descontrolado da água, com a imbecilidade do pensamento de que “temos muito, podemos usar”. O problema é que, ao contrário do que se pensava, a água é um recurso finito, isto é, acaba. E quando as medidas de preservação efetivas surgirem, pode ser tarde.