Câmara aprova mais uma “Lei Teresoca”

Câmara aprova mais uma “Lei Teresoca”

Um fato pitoresco da história brasileira mostra como parlamentares nacionais atuam em atenção à vontade de mandatários, sem se importar com o verdadeiro patrão, que deveria ser o povo. Em relação à aprovação de leis no Brasil, é comum notar que estas são elaboradas e aprovadas, quase sempre, em benefício de grupos definidos, sem atender ao aspecto de que a legislação deve atender à maioria da população, nunca em favorecimento a um pequeno grupo. Porém existem situações em que o atendimento a uma vontade (desejo) particular é tão gritante, pois leis são criadas para atender a apenas uma pessoa, ou um pequeno grupo definido, que beiram à comédia e passam a ser relacionadas como casos pitorescos da nossa história. Uma situação dessas, para quem leu, entendeu e/ou estudou um pouco da história nacional, é a chamada “Lei Teresoca”. Esta lei foi criada, em 1942, com um objetivo específico: atender à vontade de quem mandava na época, um senhor chamado Assis Chateaubriand, que chegou a ter o “título” de “O Rei do Brasil”, em livro biográfico, escrito por Fernando Morais. Consta que a citada lei foi elaborada para dar direito a Chateaubriand de assumir a guarda da filha Teresa Acuña, filha dele com Cora, o que não lhe seria permitido à época, por se tratar de filha fora do casamento. À época, Getúlio Vargas exercia o poder ditatorial do País, em período iniciado em 1930 e encerrado em 1945. O ditador enfrentou, inclusive, a Igreja, que era contrária à medida, isso tudo para atender a Chateaubriand.

Agora, temos a “Lei Jairzoca” ou a “Lei Tarcizoca”, porque o principal beneficiado na “negociação” legislativa seria o atual governador de São Paulo, que é provável candidato à Presidência da República, apoiado pela “direita”, que é quem realmente domina o que se vota no Congresso Nacional. Trata-se da lei aprovada nesta semana, que vem sendo chamada de “Lei da Dosimetria”, mas que pode ser denominada de “Lei Tarcizoca”, como afirmei acima. Vamos aos fatos. A lei aprovada diminui o tempo de pena dos condenados no ato de 8 de janeiro, quando invadiram Brasília e destruíram bens públicos. E, como se sabe, uma lei não pode ter beneficiário definido diretamente, então criaram um texto que beneficia os condenados pelo 8 de janeiro, mas que também beneficia mais um monte de gente que foi condenado por tráfico, por roubo, por desvio de dinheiro... aquelas pessoas que foram condenadas pelos chamados “crimes comuns”. Conforme juristas, crimes comuns podem ser os de homicídio, furto (subtrair algo), roubo (subtrair com violência/ameaça), estelionato (fraude), lesão corporal (ferir alguém) e crimes contra a honra (calúnia, injúria, difamação). Desde que não estejam incluídos dentre os crimes hediondos, ou que tenham legislação específica que agrave a pena, o sentenciado será beneficiado com a tal “Lei da Dosimetria”, ou “Lei Tarcizoca”, como deveria ser denominada.

E por que afirmo que a tal lei beneficia mesmo é o governador de São Paulo? Ora, é fácil entender. O Bolsonaro não será anistiado com essa lei. Ele terá que cumprir, pelas informações, pouco mais de 2 anos de cadeia. Mas não terá a punibilidade diminuída e, assim, não poderá disputar eleições. Então por que aprovar a lei? Antes da aprovação, o filho do Bolsonaro, Flávio, foi lançado pelo pai como candidato a presidente, assumindo assim o controle do “patrimônio eleitoral” do bolsonarismo. E ele já foi logo avisando: “Minha candidatura tem preço, posso retirá-la”. E a moeda seria a diminuição da pena do seu pai, que, segundo os filhos, “está doente, não aguenta cadeia...”. Reduzindo a pena, o filho vai desistir da candidatura e o governador de São Paulo poderá assumir as rédeas dos votos do gado, digo, bolsonarismo, com o apoio do pai, do filho e dos asseclas. Assim, os digníssimos deputados federais aprovaram, por folgada maioria, uma lei que vai contra a opinião de pelo menos 54% da população – maioria, portanto, que concorda com as penas aplicadas aos golpistas – para atender a uma vontade/desejo do atual governador paulista de ser candidato a presidente, representando a “direita”, que tem a certeza de manter encabrestados seus eleitores/admiradores. O problema todo é que a mulher do ex-presidente tomou gosto pelo poder e pode bagunçar o negócio todo. E, é claro, a pressão popular, que pode forçar o Senado a engavetar essa negociata política. E assim a “Lei Tarcizoca” pode passar à história, como ocorreu com a “Lei Teresoca”. Coincidentemente, as duas começando com a letra “t”... rsrsrsrs

* Jornalista profissional, especialista em 

comunicação pública e membro da Academia 

Itaunense de Letras – AILE, sendo titular da cadeira 26.