A alteridade: por que conversamos sobre religião e política

A alteridade: por que conversamos sobre religião e política


ALTERIDADE, no dicionário Michaelis, é um substantivo feminino, cujo significado é característica, estado ou qualidade de ser distinto e diferente, de ser outro.

Querido leitor, gostaria de bater um papo com você sobre a existência de Deus, a comunicação entre as pessoas e o sentido de se debater religião e política.

Em mais uma conversa com um amigo querido, ateu, escutei vigorosa defesa da Teoria do Big Bang. Ele queria questionar a visão católica sobre o surgimento da humanidade. Lembrei-o que o Big Bang era fruto do estudo de um padre cientista chamado Georges Laimetre – portanto fruto da mesma crença católica que meu amigo queria refutar. Sua reação foi hesitante. E concluiu dizendo que não era bem assim. Afirmou que era óbvio que havia lacunas na explicação racional científica sobre a existência e origem do universo natural. Pera aí: eu pensei. Se há admitidamente lacunas na base de todo raciocínio existencial da ciência, a própria ciência é fundada num ato de fé, em algum ponto que sustenta seu edifício racional. Assim, como a existência de Deus. Ou, então, ambas devem ser consideradas tão racionais quanto a outra.

Eu repliquei. A ciência, baseada na racionalidade (deusa última do ateu), usa o universo NATURAL como referência. A teoria do Big Bang explica o início deste universo natural. Com ele, o tempo teve início. Aliás, conceito de início, meio e fim só existe nesta realidade natural. O primeiro átomo da primeira molécula, numa densidade enorme, expandiu-se em todo o resto. Ora, Aristóteles, muito preciso, ilustrou numa explicação que tudo que é um fato, antes de ser, precisava possuir o potencial de se tornar. Eu só me levanto, porque poderia me levantar. Eu só escrevo, porque poderia escrever. Nenhuma existência é feita a partir do nada. Assim, se o tempo teve um segundo inicial, ele não existia desde sempre. Logo, ele foi criado por alguém fora da realidade deste universo natural. Ou seja: algo SOBRENATURAL – Este sim existe desde sempre, fora do tempo que se conta no relógio. Chamamos, este Criador, de Deus.

Deus não criaria o mundo e seus filhos a fim de implodi-los num conflito selvagem. Mas também não aprisionaria a todos em ações sobre as quais ninguém pudesse escolher errar. Criou, portanto, o livre-arbítrio e ensinou que a semente do amor é espontaneidade da escolha em exercer este amor, abrindo mão de alternativas mais descompromissadas, cômodas e fáceis. Logo, Ele enviou o Deus Filho, a fim de fortalecer a RELIGAÇÃO entre o DIVINO SOBRENATURAL e o MUNDO NATURAL, mensurado pela ciência. A palavra RELIGIÃO vem do verbo latino religare (re-ligare) que significa RELIGAR. Ou seja: ligar de novo o ser humano a Deus. Por isso, o conceito de religião não é uma mera plaquinha. Uma simples classificação, uma ideologia aleatória ou um estilo de vida. Lamentavelmente, diminuem o conceito desta maneira. São os mesmos que idolatram o humanismo e proclamam: “imagine se não houvesse religião”, “deixando religião de lado, vamos conversar”. G.K. Chesterton, arguto e indelével como sempre, explica isso simples: “A religião é exatamente o tipo de coisa que não pode ser deixada de fora - porque inclui tudo. A mais desatenta das pessoas não pode colocar tudo dentro de uma mala de mão e simplesmente esquecer a mala”.

Caro leitor, eu – como disse – defendo o livre-arbítrio de as pessoas escolherem a religião que melhor lhes aprouver. Só não consigo achar normal a contradição de muitos relativizarem o valor de lutar e se dedicar verdadeiramente ao que se escolheu seguir. O fato é simples: ou a religião de outros carrega a Verdade e a minha não pode ser verdadeira, ou a minha é a Verdade e as demais são equivocadas. Relativizar é contraditório, porque o que uma permite a outra não. Até a música Imagine, do doidão do John Lennon, que tenta relativizar geral, dizendo que tudo cabe numa crença só, exclui quem não quer acender uma vela para Deus e outra para o diabo ao mesmo tempo. 

Agora o amigo leitor me pergunta: por que você acha importante levantar esta bandeira opinativa, ao invés de ignorar toda alteridade em volta e seguir seu caminho em silêncio? Isso não é um proselitismo infrutífero? Minha resposta é simples: a selva e os animais se propuseram a fazer isso. Até o momento em que um bicho foi obrigado a engolir o outro, a fim de sobreviver. Como ninguém é perfeito, a tendência é que a alteridade se imponha de maneira agressiva, se ela não for endereçada em sua essência. E diferentemente do que muitos defendem, quando dizem que a função da religião é um mero marco civilizatório frente à selvageria: se fosse assim, a essência da alteridade seria facilmente resolvida por um sistema político que coexiste com religiões. A história mostra que política gera um resultado bem ao contrário de harmonia civilizacional. 

A essência da alteridade é sobrenatural. Ela em si não é o problema. Aliás ela precisa ser reconhecida como algo natural. Igualdade é um conceito da revolução francesa usado como ferramenta perniciosa. O ponto principal é a necessidade de boas escolhas livres que nos levem a honrar com o Criador, aquele mesmo que veio antes da fagulha do BigBang.