O seminarista

Quando se fala em livro cujo título seja O SEMINARISTA, leitores da minha idade só se lembram, na maioria das vezes, no escrito por Bernardo Guimarães, porém não é este o caso, porque estamos falando do livro homônimo da autoria de Rubem Fonseca, totalmente diverso do popularmente mencionado.
Temos aqui um livro saboroso deste autor que nos premiou com muitas obras no século vinte e também no século atual já que este em particular pertence ao Século XXI, mais precisamente publicado em 2009.
Não podemos falar da obra sem falar do escritor por trás dela. Ele nos brindou com obras monumentais tais como O CASO MOREL e AGOSTO, mas que não sei explicar, ainda não os li, estreando minha leitura com este inusitado e peculiar livro em que o protagonista é um ex-seminarista.
Este autor é mineiro e não foi por bairrismo que o li e estou a comentar, porque só descobri depois que terminei a leitura, quando me ocupei por ler a sucinta biografia na página 179, ou seja, no final do livro e lá diz que: “Carioca desde os oito anos, Rubem Fonseca, nasceu em Juiz de Fora em 11 de maio de 1925.”
A obra pitoresca nos fala de um matador de aluguel mais conhecido por especialista, contratado para eliminar pessoas indesejáveis por quem o contrata e aqui não interessa o juízo que se faça dessas pessoas se de fato são boas ou más, basta não estarem nas graças de algum desafeto, mas a maioria tem perfil que de certa forma justifica o fim que tiveram nas mãos do assassino.
O livro é escrito em primeira pessoa, onde o narrador é o personagem principal e as opiniões incontestáveis também são dele, que apesar da sordidez de sua profissão o faz bastante crível e convincente quanto aos motivos de suas execuções.
O serviço era contratado por um intermediário, de sorte que não tinha contato direto com o contratante, normalmente, o contato era mantido pelo que ele designou ser um “despachante, sujeito alto, magro, louro” e que se vestia impecavelmente de “terno preto, camisa branca, gravata preta e óculos escuros.”
Como introdução o autor nos conta alguns bem sucedidos casos em que atuara. Diz que “o último foi na véspera de natal”, fora fornecido o endereço do freguês e informado de que ele estava dando uma grande festa, bastava somente chegar com um embrulho em papel colorido, que seria fácil ser recebido para a festa. Outras informações diziam que o indivíduo a ser despachado estava “vestido de papai noel e tinha uma verruga no rosto ao lado direito do nariz”.
Aproveitando sua antipatia pelo papai noel e mais especificamente por aqueles que o interpretavam com seu famigerado “Ô,Ô,Ô” tão característico, não foi difícil para ele aceitar o trabalho e assim o fez, vestiu-se adequadamente e foi até o endereço. Para sorte sua quem atendeu a porta foi exatamente o papai noel sendo após, convidado a entrar. Pediu então ao velho: “faz o (Ô,Ô,Ô) para mim.” Enquanto verificava a verruga do lado direito do nariz, cuja constatação o fez sacar sua bereta com silenciador e desferir um tiro na sua cabeça. “Sempre dou um tiro na cabeça.”
Assim começa o romance O Seminarista de Rubem Fonseca, para nos contar a insólita história de um homem decepcionado com a religião que tendo se tornado um cético ocupa-se em matar seu semelhante, apenas e tão somente por dinheiro.
Uma curiosidade está no fato de que o personagem trouxe do seminário o conhecimento em latim, onde entrecorta suas falas com citações neste vernáculo sem deixar o leitor no vácuo, porque sempre a seguir traz a tradução do que foi dito. É salutar o seu gosto pela leitura o que mostra seu lado culto, o que não o faz uma pessoa melhor, pelo contrário justifica com frieza suas ações, cauterizando sua consciência, pois neste tribunal está sempre absolvido.
Mas a história não termina aí é preciso seguir adiante lendo 178 páginas deste romance para entender que ninguém foge ao seu destino. Se é que acreditas?