O conservadorismo depende do progressismo para existir

O conservadorismo depende do progressismo para existir


Edmund Burke é o nome do craque que inventou a moda atual de se auto intitular conservador. Burke morreu em 1797, no Reino Unido. Ambos, Conservadorismo e Progressismo, nasceram junto com o processo de laicização do Estado Moderno. O primeiro depende do segundo, igual o jeito e o comportamento do Super-Homem dependem Lex Luthor para existirem. Lex Luthor e Progressismo, em cada novo filme que aparecem, estão diferentes, mudados, mais dinâmicos, mais expandidos. Em razão disso; o mestre italiano Noberto Bobbio nos ensina três fatos iniciais sobre o que é ser conservador. A definição de conservadorismo não existe dentro de uma teoria política comum. Há pouca propensão de quem se auto intitula conservador em organizar as próprias ideias. Há um abuso do termo “conservadorismo” na linguagem cotidiana.

Antes da Revolução Francesa, o período chamado de clássico foi estruturado dentro de uma visão estática da natureza, detida na história, em um desenvolvimento cíclico. Com momentos áureos e decadentes, intercalados. Sem conflito social que buscasse redirecionar o rumo das coisas para um estado de coisas propositadamente ótimo. Com o iluminismo, tentou-se fazer do mundo prático e racional, a bússola de equilíbrio espiritual do homem. O inventor do conservadorismo entra em campo exatamente neste momento. Segundo R. Blake, em “The Conservative Party from peel to Churchill”, “Burke representa as posições daqueles que, sendo intérpretes e protagonistas das profundas mudanças sociais, econômicas e culturais ocorridas no cenário europeu a partir do século XVI, haviam dado início à mundanização da vida, sem, contudo, se afastar do ideal de um universo moral estável e ligado a um sistema de valores transcendentes”. Aquilo que deu origem ao progressismo também vem daí. Enquanto a tese progressista, mais radical, via o homem como uma figura exclusivamente histórica e capaz de se moldar a níveis de conhecimento cada vez mais elevados e a formas sempre novas e teoricamente mais frutíferas de convivência social (em razão de serem racionais); a tese conservadora considerava a natureza humana não modificável pela ação prática, porque tinha suas raízes em uma realidade sobre-humana, com vontade divina, de maneira que nem o conhecimento, nem a ação política tinham inteira capacidade definidora.cPara o conservadorismo, o poder político é o cimento da sociedade e é preciso defender com unhas e dentes a supremacia da lei, em sua função de proteção do poder político e de todo sistema que o mantém. O progressismo acredita que o homem, como ser fundamentalmente livre e racional, é virtualmente capaz de criar comunidades onde não exista a coação e prevaleça a cooperação espontânea – nos ensina J. Freund, em ‘L’essence du politique’. Segundo Bobbio, o progressismo se baseia em três pilares: o científico – que fez das ciências naturais modelos a imitar no desenvolvimento das ciências humanas e do próprio homem, o democrático – que viu na extensão do poder de decisão política a todos os indivíduos o melhor resultado a que se poderia chegar, e o histórico-materialista – que fez da luta de classes o pré-requisito do necessário progresso humano.

No século XX, a sociedade de massas, dirigida por meios de comunicação que reforçam as normas de organização decretaram o fracasso do conservadorismo, segundo o respeitadíssimo pensador espanhol, Ortega y Gasset: “o conservadorismo. Seduzido pela aparente objetividade dos valores da ciência, não saiu vitorioso com tais progressos: tendo trocado seu ontologismo (visão de mundo filosófica) pelos valores práticos oriundos das ciências naturais, traiu sua razão de ser, que era defender a estabilidade social em nome de uma filosofia de limitações humanas, adotando de maneira indireta e ambígua, o secularismo e a visão histórica aberta a que queria se opor”.

É hora de o conservadorismo voltar ao ringue para aprofundar sua crítica ao laicismo racionalista tão encharcado na ideia de progresso moderna. E para aqueles que gostam de dizer que questionar o ‘laico’ em favor do sobrenatural é antidemocrático, lembro sempre que as leis e as eleições exprimem a consciência comum da maioria dos cidadãos (que no caso do Brasil são cristãos-católicos, crentes daquilo que a Santa Igreja ensina e influencia na formação moral e cultural). Essa consciência comum é submetida ao jogo livre do diálogo e das propostas alternativas, que têm por base (ou que podem ter por base) profundas convicções éticas. Logo, é óbvio que movimentos de oposição, e, portanto, também as crenças religiosas, podem tentar influir democraticamente sobre o teor das leis e das eleições que não consideram correspondentes a um ideal ético que lhes pareça não simplesmente religioso, mas compartilhável por todos os cidadãos.