A Mesa assume o risco da manobra de Toinzinho
A história da política itaunense, hoje, deixa de ser disputa de grupos e se torna, de forma direta, uma discussão sobre limites. O presidente da Câmara, Toinzinho, ao reconhecer publicamente que a Mesa “optou” por uma CPI e empurrou outra para um futuro incerto, apesar de ambas preencherem requisitos, não descreveu apenas um arranjo de agenda. Ele ofereceu uma confissão perigosa: a ideia de que a instalação de CPI pode ser tratada como escolha de conveniência.
A última reunião plenária alcançou quase mil visualizações no YouTube em cerca de um dia. Um marco. Parei para assistir. Fui pesquisar com atenção a aula de lei que inúmeros vereadores deram ao tentar alertar Toinzinho e sua Mesa diretora aliada sobre a gravidade da manobra que tentavam.
Esse tipo de postura não costuma terminar bem para quem a sustenta. A história recente do país registra, com nitidez, o que acontece quando a Presidência de uma Casa tenta sufocar ou domesticar instrumentos de fiscalização. O Supremo já afirmou, em diferentes episódios, que a instalação de CPI não se submete a juízo de conveniência do presidente e de sua Mesa quando os requisitos constitucionais estão atendidos. No caso da CPI da Pandemia, por exemplo, a decisão do STF destacava exatamente isso: atendidos os requisitos, o Presidente e sua Mesa obedecem à criação imediata. Não têm que concordar se ela “é robusta”, como ironizou Toinzinho. A vontade política dele e da Mesa é proibida de fazer da forma e no tempo que acharem melhor.
Em 2007, no episódio da CPI do apagão aéreo, o Supremo Tribunal reafirmou o direito da minoria e a ideia central de que CPI é exceção constitucional ao princípio majoritário, criada para impedir que a maioria transforme fiscalização em favor.
O recado é simples: quando a Mesa tenta selecionar o que “anda” e o que “não anda”, o Judiciário costuma reencaixar a Casa no trilho. E esse é o primeiro conjunto de consequências reais para quem insiste em operar manobra. Se a Câmara de Itaúna precisar chegar a este ponto, o constrangimento público de Toinzinho será o menor dos problemas que enfrentarão. Vem, também, como risco de nulidade de atos, paralisia política e erosão da autoridade da própria Câmara, que passa a ser vista como instituição incapaz de garantir seus próprios procedimentos.
Em política, não é apenas quem assina a caneta que paga o preço. Paga também quem dá sustentação repetida, sobretudo quando a sustentação se torna previsível e automática. Quando a Presidência admite que escolheu, a base de aliados deixa de ser “base” e passa a ser avalista de um jeito de se fazer política. O eleitor não precisa dominar artigos e incisos para entender a essência: “esta Mesa atual da Câmara escolhe quando fiscaliza”. Isso fixa rápido, circula rápido e gruda nos nomes de quem protege.
O caso Eduardo Cunha é o exemplo mais duro, no Congresso Nacional, de como um Presidente cai rápido, quando enxerga uso do cargo para interferir nas regras e para controlar o ambiente institucional. Em 2016, o STF determinou o afastamento de Cunha do mandato e da Presidência da Câmara dos Deputados na Ação Cautelar 4.070, justamente pelos riscos escancarados, graves, ligados ao exercício da função e à integridade do processo. Quando a estrutura do cargo é percebida como instrumento de obstrução, a consequência pode ultrapassar o debate político e chegar ao afastamento. E não é só de Toinzinho, mas da Mesa toda, como mostra o episódio citado no plenário de Itaúna na última terça, sobre a Camâra Legislativa do DF, em 2016, quando a Mesa foi afastada, junto com a Presidente e com um assessor de confiança. O motivo: risco de uso da estrutura da Casa para obstruir as regras do funcionamento de uma CPI. Pesquisando um pouco mais, vemos que o STJ também registra precedentes em municípios.
Isso mostra que o “não dá nada” é uma aposta ruim. Dá, e dá de forma objetiva: perda de comando, desgaste público, isolamento político, e uma Câmara obrigada a operar sob a sombra de decisões judiciais.
A Mesa que hoje sustenta Toinzinho tem uma escolha prudente a fazer: pode seguir como correia de transmissão de uma conveniência que já nasceu frágil, ou podem recolocar a Câmara na posição institucional correta, exigindo transparência, fundamentação, respeito ao rito e decisão imediata de questões que impactam o devido processo legislativo.
Não é “trair” Toizinho, é sobre trair a própria história política que cada um escreverá na Câmara de Vereadores de Itaúna. A crise está crescendo, o interesse público está observando de perto. A Presidência de Toinzinho faz um discurso humilde, enquanto cava rápido sua queda. O que funciona para ele, pode não funcionar para os membros da Mesa que ele usa como escudo. Quem fica exposto é o aliado silencioso, aquele que não pediu registro, não exigiu fundamento, não cobrou procedimento, e depois tenta convencer a cidade de que “não era bem assim”.
Se a rede de apoio pretende sobreviver politicamente a este episódio, precisa deixar de sustentar conveniência e passar a sustentar regra. Em política local, o custo raramente recai sobre abstrações. Ele recai sobre nomes.







