Alguém espia nas trevas

Alguém espia nas trevas


Nos dias que antecediam a execução de Ronald Thompsom ele se hospedara naquele hotel pagando adiantado e em dinheiro uma estadia de três dias. Olhava atentamente o noticiário na televisão no apartamento 932 do Biltimore Hotel em Manhatan Nova York. O som da TV era quase inaudível de tão baixo que estava, e ele não se interessava por nenhuma outra notícia, queria apenas acompanhar a entrevista. 

Tomara um banho e se barbeara, pois enfim, chegara o grande dia e a ansiedade provocara-lhe certa tremedeira a ponto de se cortar, enquanto escanhoava a barba próximo do lábio inferior.

Estava aborrecido com o porteiro, porque inspecionara as roupas em sua bagagem, além de olhá-lo com certo desdém e questioná-lo sobre a reserva do quarto. 

Agora, porém, iniciariam os debates, os prós e os contra da pena de morte, recentemente restabelecida no Estado de Nova York. O âncora do programa Today, Tom Brokaw, com voz contida, inicia a apresentação do assunto: “O restabelecimento da pena de morte se tornou a questão mais emocional e controvertida deste país desde a guerra do Vietnam. Daqui a apenas cinquenta e duas horas, às onze e meia do dia 24 de março, haverá a sexta execução deste ano, quando Ronald Thompson, de dezenove anos, morrerá na cadeira elétrica. Meus convidados...”, o homem à sua direita, com pouco mais de trinta anos, fervoroso defensor da implantação da pena de morte no país, Steve Peterson estava sisudo e compenetrado, tinha as mãos juntas com os dedos indicadores apontados para cima, enquanto o queixo descansava nas extremidades deles. Já à sua esquerda, estava uma jovem mulher de cabelos cor de mel, cujo penteado para trás culminava num coque frouxo. As mãos descansavam no colo, apesar de demonstrar a tensão por estar com os punhos cerrados, assim Sharon Martin, autora do best seller O CRIME DA PENA DE MORTE era a legítima defensora da extinção da pena capital, entendendo que, a punição deveria ser banida em todo território nacional. 

O primeiro confronto entre os contendores havia ocorrido em debate semelhante a seis meses atrás e para dar início ao derradeiro debate, o apresentador Tom Brokaw, perguntou a Steve se depois do primeiro debate e das repercussões que ele causou, se ainda mantinha a mesma posição, recebendo como resposta que: “não tinha ele, STEVE, a menor sombra de dúvidas da necessidade da pena de morte para conter o avanço desmedido da violência” e para não deixar o clima cair, foi logo perguntando a Sharon: qual a sua opinião a respeito... Apesar do cansaço, porque naqueles meses que se seguiram ao primeiro entrave, ela passou seus dias visitando gabinetes e pessoas importantes no afã de convencer a governadora do Estado a revogar a pena de execução, a sua resposta foi pesarosa ao afirmar que: “estávamos dando um grande passo para trás na direção da idade das trevas”.

Nada desta discussão interessava ao telespectador diante do televisor, ele tinha outros planos...

Este é o segundo livro desta autora, que ganhou uma legião de leitores em meados dos anos 70. Legítima herdeira de como contar uma história policial, ela se aventurou na arte de escrever, quando se viu viúva com cinco filhos para criar, sem renda e uma profissão a altura para viver com certa dignidade. 

Seu primeiro livro “Onde estão as crianças?” foi um sucesso de vendas e crítica. E a autora tem como traço o suspense investigativo em que personagens improváveis solucionam crimes, ou seja, que apesar de não serem policiais, estão envolvidas de certa forma com os acontecimentos, o que os leva a assumirem as rédeas dos casos. 

Ficou conhecida como a rainha do suspense e havendo o primeiro livro se tornado um “best seller”, não parou mais de escrever. Foram ao todo 60 (sessenta) livros de ficção afora outros, e teve seus livros transportados para as telas do cinema e televisão. Ela faleceu coroada de anos em 2020, com 92 anos de idade. 

Esta história, e creio, que a maioria de seus romances de suspense, são verdadeiros dramas da atualidade, típicos do século XX e a autora escrevia ambientando suas obras nas complexas relações pessoais da pós-modernidade.

Mary Higgins Clarck é um espetáculo à parte no universo dos romances de suspense, porque investe muito no drama e menos na ação, muito embora presente em toda obra. A linguagem adotada é limpa, clara e fácil, então, se dê uma chance e leia esta autora, porque é no mínimo prazeroso.